CERAMISTA, ESCULTOR E FUNDADOR DA QUINTA VILA RACHEL
por António Teixeira Lopes da Cruz, Proprietário da Quinta Vila Rachel.
data da publicação: 1 de Março de 2023
Apesar de muito cedo ter fixado residência no Porto e, depois, em Vila Nova de Gaia, Teixeira Lopes e sua mulher Rachel mantiveram bem vivos os laços que os uniam à sua S. Mamede natal, que se traduziam em frequentes visitas aos seus familiares e amigos aí residentes, apesar das dificuldades de transporte e desconfortável duração das viagens. Seguiam do Porto até Alijó em diligências, com várias paragens, inclusive para pernoitar, e desta vila até S. Mamede em muares dali levados para os conduzir ao destino final. Viagens que, aos olhos de hoje, seriam consideradas atrozes.
À época, o rio Douro não era uma boa opção, atendendo às dificuldades e perigos que a sua penosa travessia aportava.
A situação melhorou drasticamente quando a Linha de combóio do Douro chegou ao apeadeiro de S. Mamede do Tua, em 1883, tornando as deslocações de e para o Porto muito mais rápidas e confortáveis.
No entanto, os cerca de cinco quilómetros a percorrer desde o apeadeiro até S. Mamede de Ribatua em caminho de terra batida, interrompido parcialmente por um monte pedregoso, que os muares tinham dificuldade em vencer, tornava este final de jornada particularmente indesejável. Tal situação mantinha-se ainda nas primeiras décadas do século XX. (1)
Com o passar do tempo o casal foi aumentando o seu património rural, quer por heranças, quer por aquisição de propriedades, de tal forma que nos anos 80 do século XIX possuíam três quintas, além de terrenos agrícolas e florestais dispersos, que produziam, no seu conjunto umas cinquenta pipas de vinho. Numa delas (Quinta da Levandeira, actual Quinta Vila Rachel), Teixeira Lopes mandou construir, nos anos 90 do século XIX, uma casa de boa dimensão, que teve seu filho José como arquitecto e que se conserva na família. Apesar das alterações/beneficiações efectuadas ao longo das gerações, foi possível preservar o espírito da casa e a sua atmosfera romântica.
* Quinta Vila Rachel, (fotografia do autor)
Através da leitura de correspondência trocada entre Teixeira Lopes, Rachel e seu irmão Eduardo com o caseiro Joaquim de Castro, residente em S. Mamede, que era primo e afilhado do casal, verifica-se que Rachel planificava e controlava as actividades agrícolas, enquanto Eduardo tratava dos assuntos financeiros, alijando alguma carga de preocupações a Teixeira Lopes, que já as tinha em demasia na Fábrica, e que só intervinha episodicamente.
Estes postais, de 1905, que Rachel e Eduardo escreveram ao caseiro abonam o que foi dito:
* colecção do autor
OBRAS NA IGREJA MATRIZ
O escultor, como já vimos, fizera várias peças de arte para a sua terra, e, em 1902, em parceria com António Lopes Agrelos, que fizera fortuna na Argentina, patrocinou obras de vulto na igreja matriz de S. Mamede, tendo fornecido os azulejos para o seu exterior e interior, bem como os mosaicos hidráulicos que revestem o seu chão (tudo material produzido na Fábrica das Devesas)
Por esta generosa contribuição, foram os dois beneméritos homenageados com uma placa adossada à parede exterior do adro da igreja:
* Placa
* Azulejos que revestem o exterior da igreja
(fotografias do autor)
TESTEMUNHO DO FILHO ANTÓNIO
“Meu pai e minha mãe tinham um grande amor à sua terra; ali nasceram, ali passaram a infância, amaram e casaram, aspirando passar lá também os últimos anos, à sombra daquelas penedias, ouvindo cantar os rouxinóis”...
...”Era o primeiro Domingo de Setembro...saindo a procissão com vistosos e garridos andores... sobressai a imagem de Nossa Senhora das Graças, que meu pai esculpiu em madeira, com cabelos e vestes naturais.... meu pai não deixava de pegar em uma vara do pallium, vestindo o seu melhor fato preto, de sobrecasaca, em que ostentava a sua cruz de Cavaleiro de Cristo. (2)
(1) Lopes, José Marcel Teixeira Lopes – “Teixeira Lopes íntimo e a bela época de 1900”, dactilografado, s/ data, pgs. 39,40
(2) Lopes, António Teixeira – “Ao Correr da Pena Memórias duma Vida”, ed. em 1968 pela Câmara Municipal de Gaia, pg. 271