O grave problema ambiental da sua propagação
O tipo de agricultura com o impacto mais invasivo e destruidor é sem dúvida a monocultura intensiva. Embora seja um método que se tornou convencional, este modo de agricultura representa um problema grave para o meio ambiente. Os tempos são de mudança e cada vez mais se discute e se dá importância a assuntos relacionados com a sustentabilidade e ecologia do meio ambiente, por isso é relevante expormos o porquê deste problema causado pelas monoculturas. São diversos os malefícios apontados a este tipo de prática, os quais irão ser analisados já de seguida.
Os exemplos do que se passa na Amazónia (1) e na Indonésia (2) são fulcrais para entender este flagelo. Na Amazónia estão a ser dizimados centenas de milhares de hectares de floresta tropical para venda de madeira e plantação de soja (3)para óleos e rações da indústria agro-pequária. Inteiros ecossistemas de biodiversidade animal e vegetal estão simplesmente a desaparecer para ser plantado praticamente soja. Na Indonésia pela primeira vez se fala no conceito de “animais refugiados” (4) devido à destruição de floresta tropical para a plantação de monocultura de Palma, esta para ser transformada em óleo e ser usada em tudo o que é produtos processados para uso no nosso quotidiano. A população de macacos orangotangos está simplesmente a ficar sem lugar para viver pois o seu habitat que contém toda a vegetação essencial para o seu desenvolvimento está a desaparecer.
A monocultura não é uma prática sustentável e por isso necessita continuadamente de utilizar produtos químicos para ajudar no desenvolvimento das plantas. Está completamente dependente de fertilizantes, herbicidas, pesticidas e fungicidas. Num panorama natural a planta consegue ir buscar ao solo todos os nutrientes que precisa através da população microbiana que vive junto das suas raízes. Esta população diversa de fungos, bactérias, nematódes, protozoários e outros mais formam entre si uma cadeia alimentar cujas substâncias resultantes deste sistema se encontram em perfeito estado para serem assimiladas pela planta. Se por um lado a planta precisa dos nutrientes resultantes do processamento da cadeia alimentar destes animais entre si, estes precisam também de material vegetativo morto para poderem decompor em comida para si mesmos. Assim os micróbios acabam por ser o elo de ligação entre os minerais do solo e a própria planta, que no fundo acaba por ser um sistema simbiótico que a Natureza criou em que as plantas necessitam dos micróbios para sobreviverem e vice-versa. (5) No panorama actual da monocultura as coisas são completamente diferentes. Este sistema simbiótico é quebrado por diversas formas. A primeira delas é quando se adicionam fertilizantes de síntese. Estes são produzidos de forma a estarem perfeitamente assimiláveis pelas plantas (6) , ou seja ao serem introduzidos na terra são directamente absorvidos pelas raízes das plantas, passando ao lado da acção microbiana (6) . Desta forma, para além de criar desequilíbrios no ambiente, o agricultor deixa de usar também práticas sustentáveis tão antigas e eficientes como a compostagem ou o mulching, práticas estas que servem precisamente para adicionar material vegetativo ao solo para atrair micróbios, ou no caso do composto, que já virá pronto a ser recebido pela planta mas em quantidades equilibradas. Conclui-se por isso que o uso continuado de fertilizantes desregula por completo o ambiente natural do solo, fazendo com que as populações microbianas desapareçam, tornando as plantas dependentes destes produtos. Este sistema simbiótico tão valioso é também quebrado com o uso de todo o tipo de químicos mencionados em cima. Os herbicidas aplicados para matar as ervas infestantes mata também as populações microbianas. O mesmo se passa com os fungicidas, insecticidas e pesticidas aplicados na cultura. ( 7)
Visto que na monocultura a biodiversidade vegetal é praticamente inexistente, isso terá graves repercussões também na biodiversidade animal. As plantas atraem animais. E podemos ir mais longe nesta afirmação. Certos tipos de plantas atraem certos tipos de animais. Por exemplo, há pragas de insectos que atacam culturas simplesmente porque não têm por perto predadores, outros insectos ou pássaros acima de si na cadeia alimentar. Ao revés num sistema em que prime pela biodiversidade, a população de insectos e aves vais ser enorme, e por isso irá ser um sistema em que a cadeia alimentar geral estará perfeitamente equilibrada, não permitindo com facilidade o aparecimento de pragas. Imagine-se uma floresta habitada com uma quantidade diversa de animais e plantas todos juntos a colaborar entre si. (8)
Como já foi referido em cima, num sistema de monocultura a única vegetação existente no solo é a planta escolhida para cultura. Tudo o resto é considerado infestante. Por isso é normal vermos os terrenos agrícolas com a terra sempre à mostra, ou por acção dos herbicidas ou pelo lavrar da terra. Desta forma a cobertura vegetal é inexistente. Ora esta cobertura vegetal é importantíssima para o controlo da erosão dos solos. Já foram inclusivamente feitos diversos estudos sobre a acção das chuvas em solos cobertos e em solos descobertos e chegou-se à conclusão que os solos descobertos perdiam quantidade enormes de terra que era facilmente arrastada pela acção da água . Enquanto isso os solos com cobertura conseguiam ter uma estrutura mais coesa devido à acção do longo e complexo sistema de raízes da vegetação, conservando de forma íntegra o estado do solo. Daí a enorme importância de haver uma cobertura vegetal o mais biodiversa possível. No caso de regiões montanhosas onde se pratique agricultura com recurso a muros e taludes, é de especial importância deixar crescer vegetação expontânea para suportar os mesmos. Esta vegetação vai servir de alicerces para toda a estrutura se manter coesa quando for época de chuvas. (9)
Os terrenos perdem biodiversidade com a plantação de uma só cultura e por isso os animais nativos perdem o seu habitat levando à sua extinção. Há centenas de casos destes ao longo da história mais recente do Homem. A sua pegada tem sido demasiado forte e com isso traz consequências nefastas. Veja-se o que está a acontecer na Amazónia, na Indonésia ou noutros lugares do planeta em que um número gigante de espécies se encontra em perigo precisamente devido ao desmatamento e desflorestação para dar lugar à mono cultura. (1) (2)
Já vimos em cima que a monocultura intensiva utiliza uma série de produtos nefastos para o controlo e aplicação das suas práticas culturais. Ora estes produtos utilizados, não sendo biodegradaveis, vão-se acumulando nos solo e eventualmente chegar aos lençóis freáticos. A partir daí estas substâncias tóxicas podem-se espalhar por tudo quanto é sitio e poluir o meio ambiente, sem que possamos ter o controlo da situação. É por isso da mais extrema importância evitar que isto aconteça. (10)
A primeira coisa a fazer é simplesmente não fazê-la. Temos de pensar que a agricultura é uma actividade com um impacto muito grande no nosso planeta, e que há muitas outras alternativas a este método prejudicial ao meio ambiente. Em vez de apostar numa só cultura, porque não apostar em 10 ou mais todas misturadas? Sem dúvida a melhor resposta ao flagelo da monocultura é a policultura, e a isto se costuma designar normalmente de Sistemas Agroflorestais. Os agricultores infelizmente têm a tendência em pensar a agricultura como se pensa uma indústria convencional, como se o seu terreno fosse uma fábrica, ou seja, o seu objectivo passa pela especialização e foco em um ou dois produtos para se ser forte nisso. Enquanto esta ideia tem as suas vantagens na indústria em geral, na agricultura as coisas são diferentes. Estamos a falar de alimentos naturais e não de produtos artificiais, logo a especialização e o foco não pode ser encarado da mesma forma. Enquanto na indústria a tendência é diminuir o número de referências no portefólio, na agricultura tem de ser exactamente o oposto, terá de haver um aumento para que as culturas possam colaborar melhor entre si no combate às pragas e também para que consigam construir entre si sistemas de sobrevivência fortes, como por exemplo conexões no subsolo para comunicação e troca de alimentos.
O domínio da Agrofloresta está cada vez mais em voga no mundo actual, sendo cada vez maior o número de agricultores a optar por estes sistemas agro-ecológicos, e que por mais estranho que pareça, que já estão em vigor à milhares de anos e que foram estranhamente abandonados no século XX com a industrialização da agricultura. Estamos por isso e bem a regressar às origens.
por
Tiago Cartageno
Proprietário da Quinta Vila Rachel
(1) Conservation International / https://www.conservation.org/places/amazonia
(2) Conservation International / https://www.conservation.org/places/indonesia
(3) WWF World Wildlife Fund Soy | Industries | WWF
(4) International Animal Rescue / Orangutan Rescue | Projects | International Animal Rescue
(5) Teaming with microbes, The organic Gardener´s Guide to the Soil Food Web by Jeff Lowenfels & Wayne Lewis
(6) Here’s the scoop on chemical and organic fertilizers | OSU Extension Service
(8) https://www.aimspress.com/fileOther/PDF/agriculture/agrfood-01-00157.pdf
(9) https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0341816212002329
(11) FAO /Food and Agriculture Organization of the United Nations ( http:// www.fao.org/forestry/agroforestry/89997/en/_ )
(12) Dr Elaine Ingham https://www.soilfoodweb.com